Assim que eu terminei a graduação em meados dos anos 10 me deram conselhos de engatar logo em uma pós graduação. Na época, como um bom jovem, acabei ignorando completamente esse conselho. Estava mais interessado em procurar outras coisas e me distanciar um pouco do meio acadêmico que passei durante uma boa parte da minha vida adulta. Nesse mês de março de 2021, completei um ano como aluno de pós graduação no programa de mestrado acadêmico de uma universidade federal brasileira.
Inscrito e selecionado pra fazer o mestrado, me faltava fazer a matrícula e inscrição de disciplinas. Indo lá pra cometer o ato, já tive a dor de cabeça de pegar transporte público pra outra cidade em hora do rush. Essa talvez tenha sido a minha primeira experiência com o mestrado: pra terminar no tempo estimado de 2 anos de duração, seria necessário fazer pelo menos 3 disciplinas por período no primeiro ano Tinha uma disciplina que contava com horários aleatórios e avulsos como 15:30 da tarde. Pra todo proletário em período integral, isso é um pesadelo de escala horária. Ainda mais adicionando fator transporte público caótico de uma cidade maravilhosa pra outra. Seria uma prévia do que ia acontecer nos próximos anos. Seria. Futuro de um pretérito que não aconteceu nessa realidade.
Como tudo em 2020/2021, não foi um período típico. O mundo pegando fogo, terceira guerra mundial na porta, acidente aéreo do Kobe e da filha dele e o ano ainda nem tinha começado direito. A pandemia veio. Como sobreviver no meio disso tudo e quiçá estudar? A universidade tomou a decisão de que todas as atividades presenciais seriam suspensas. Entra o famoso EAD.
Me inscrevi em quatro disciplinas no primeiro período pensando VAMBORA, É EAD. Terminei com duas, e por pouco. O próximo foi mais tranquilo? Não, me inscrevi em quatro também. Aprendo bastante com meus erros né? Dessa vez, cheguei até o final com as quatro deu pra começar a pensar na pesquisa.
Toda graduação tem como objetivo ter um produto final. Na graduação é o TCC/Monografia, no mestrado é a dissertação e doutorado é a tese. No início, não tinha muita ideia do que seria o objeto de estudo da dissertação. Meu TCC foi na área de computação visual e pretendia seguir estudando na mesma área. Tinha alguns interesses, e ainda tenho, em inteligência artificial mas acabei me enviesando mais pra esse lado. Que aliás é o motivo pelo qual escolhi uma universidade de outra cidade pra fazer o curso: os professores nessa área eram mais alinhados com a linha de pesquisa que queria seguir. No meio do caminho, consegui definir um objeto de estudo com ajuda do orientador que escolhi e segui com os estudos. Aqui entrou reuniões períodicas, leitura, experimentação e implementação.
A pesquisa é basicamente fazer uma revisão de toda a literatura relevante pro seu objeto de estudo, digerir tudo o que tá sendo dito ali e propor algum tipo de experimento ou projeto que faça uma contribuição para esse campo do conhecimento. E aqui, pelo menos no início, tem uma coisa que fiz e continuo fazendo até hoje: ler. Ler os artigos com as palavras chaves. Ler as dissertações, teses, capítulos de livros etc. Nem tudo é relevante então dá pra descartar muita coisa lendo só o abstract. A quantidade de literatura parece um tanto quanto opressivo no inicio e pelo menos pra mim foi. Mas com o tempo foi melhorando. No início, não conseguia entender metade das palavras nos artigos, nem conseguia formar palavras chaves certas pras buscas. Mas vai melhorando. Até chegar no passo de entender e conseguir explicar tudo com as próprias palavras. Percebe que não é um processo mágico, que tudo tem seu motivo. É como ver aquelas letras da Matrix: depois de um tempo você nem vê as palavras, só visualiza os conceitos.
Hoje, minha formação tá mais ou menos nos eixos: já terminei as disciplinas e estou exclusivamente na parte de pesquisa. O que, na minha opiniao, é a parte mais legal. Infelizmente, as disciplinas que fiz adicionaram pouco a minha formação porque:
- Por já ter uma base sólida na área de computação foi mais um repeteco do que um aprendizado novo. Sempre dá pra absorver mais coisa e contribuir mais. Mas fica o gosto de tempo que poderia ter sido melhor aproveitado. Entendo que seja uma forma de nivelar pra quem não tem a mesma base da área, tem muitos alunos de outros cursos, com outras experiências.
- Ainda existem as disciplinas obrigatórias que, por mais que sejam úteis, dá pra se virar sem se a sua área de pesquisa não for exatamente o conteúdo tratado nessas.
Talvez estas sejam críticas mais direcionadas ao programa de pós graduação que me encontro do que a todos de uma forma geral, mas uma forma de solucionar seria aceitar pedidos de equivalência da graduação.
Durante esse ano, valeu a pena? Sim. Recomendo? Depende. Para uma carreira acadêmica, é o único caminho. Acho que consegui mostrar aqui como é uma experiência enriquecedora. No mercado de trabalho da área de computação tem muitas áreas que não pedem nem graduação, só o notório saber. Algumas áreas exigem possuem esse tipo de requisito explícito, ou implícito, de pedir um mestrado ou até doutorado, principalmente relacionadas a pesquisa e desenvolvimento. Ou para aqueles que querem mudar de país, não é necessário mas é mais fácil justificar burocraticamente a imigração com um diploma de ensino superior debaixo do braço, alguns empregadores estrangeiros inclusive precisam falar porque estão contratando um estrangeiro ao invés de um profissional local.
De qualquer forma, daqui pra frente minhas expectativas são boas. Estou curtindo fazer a pesquisa nos meus termos, com a ajuda do orientador e colegas de pesquisa. E daqui a um ano o relato seja de um mestre. Fiquem tranquilos, não vai subir a cabeça e não vou exigir que chamem de mestre. Camarada já está bom.
PS: Espero que esse post envelheça como vinho e não como leite…